sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Equilíbrio nas relações humanas

A melhor forma de anular-se é supervalorizar os outros.
A melhor forma de perder a própria liberdade é dar liberdade demais aos outros.
A melhor maneira de perder o contato consigo mesmo é estar constantemente em excessivo contato com os outros.

"O silêncio, o isolamento espontâneo, são muito saudaveis para o indivíduo, podendo permitir-lhe reflexão, estudo, auto-aprimoramento, revisão de conceitos perante a vida e a paz interior."
(Joanna de Ângelis, no livro "O homem integral", psicografado por Divaldo Pereira Franco)


Mas, por outro lado...

A pior maneira de aprender sobre o mundo à nossa volta é evitando a vida em sociedade.
A pior maneira de alcançar a satisfação plena é priorizando unicamente a satisfação própria.
A pior maneira de realizar conquistas é excluindo delas as pessoas que amamos.

"Porque nenhum de nós vive para si." 
(Romanos, 14:7)


Por fim...

A melhor maneira de viver é com equilíbrio, seja em nossas relações com os outros, seja na com nós mesmos, sempre.


Caminho do equilíbrio
(André Luiz)

Seja calmo, sem cair na inércia ou na omissão que denunciam a presença do comodismo. 
Seja alegre, sem se deixar levar pelo pieguismo que representa desajuste de alma. 
Seja dinâmico, sem permitir que a arrogância domine seu espírito. 
Seja amoroso, sem faltar com o necessário comedimento nas horas precisas. 
Seja compreensivo, mantendo sempre o espírito de serviço ao próximo, sem fugir ao bom senso. 
Em qualquer situação ou circunstância procure ser aquele que trabalha com inteligência e bondade, equilíbrio e humildade, visando sempre à sementeira do Bem.

(do livro "Novas Luzes")

Planos que não podem se concretizar

"Digo-vos que não sabeis o que acontecerá amanhã. Porque, que é a vossa vida? É um vapor que aparece por um pouco, e depois se desvanece."
(Tiago 4:14)


Por vezes as circunstâncias e eventos inesperados da vida impedem-nos de concretizar alguns planos que fazemos... O fato é que nem sempre aquilo que planejamos coincide com aquilo que é mais necessário para nós. 


Se o objetivo é nobre e digno, é sempre recomendável lutarmos por ele. Contudo, se mesmo após o esforço afigurar-se inviável a concretização, é porque, de fato, não era para ser assim. Não é uma questão de carma nem de destino: é uma questão de entender que nem tudo nos é concedido. Não estamos preparados para tudo que desejamos alcançar... Ou talvez não somos merecedores. Ainda.

Desculpas

É cômodo utilizar teses biológicas e antropológicas ("o homem é produto do meio") como desculpa para nossa resistência em vencer tendências ruins ou para explicar porque nos acomodamos. É fácil culpar o mundo, a sociedade, o capitalismo, o governo, a mídia, a criação que nossos pais nos deram, o trauma de infância, a Rede Globo, a Igreja Católica, os Illuminati, a Dilma Rousseff, a mãe, o pai ou o ex que nos fez sofrer. É prático justificar nossas próprias fraquezas com base na forma como o mundo se encontra hoje. É muito fácil fazer uso desta retórica de que a causa está fora de nós, e não dentro.

Quem opta por esse discurso parece não ter noção de que a sociedade precisa caminhar, e o mundo precisa tomar seu rumo, independente de como isso afetará particularmente a vida das pessoas. O tempo não para pra esperar que todos criemos um modelo perfeito de vivência. Enquanto cada um cuida de sua vida, o arcabouço social do mundo precisa existir para que este siga em frente; e em se tratando de um mundo de seres imperfeitos, como esperar que este arcabouço seja perfeito?

Passaram-se anos até que fosse montada toda esta estrutura que encontramos pronta quando nascemos, esta estrutura que influencia o nosso jeito de ser e agir. E, quando ainda não éramos vivos, as pessoas também eram atingidas por isto, as pessoas também reclamavam. Nunca houve, porém, um momento especial em que todos se uniram para reformular o conjunto de normas e princípios que paira sobre o mundo e afeta a todos que vivem nele. Nunca houve, porque é impossível que algo assim aconteça.

É utópico desejar que a sinfonia que rege o planeta se transforme toda de uma vez, e é estúpido esperar a chegada deste momento para enfim tomar uma atitude em relação ao que é preciso mudar em si mesmo. Pensar assim é ingênuo, é ridículo.

A única maneira de promover uma mudança significativa no mundo inteiro é cada habitante dele resolver mudar a si mesmo. Novamente, como é impossível exigir e garantir que todos façam isto ao mesmo tempo, a maneira mais viável é começar por si próprio. Foi isso que Ghandi quis dizer quando afirmou que "devemos ser a mudança que queremos ver no mundo".

É inegável que certas circunstâncias externas produzam efeitos intensos sobre nossas vidas e sobre nossas personalidades; porém, dizer que a a intensidade destes efeitos é tamanha a ponto de não sermos capazes de resistir, ou a ponto de impedir que ajamos de forma diferente, é uma ilusão, uma mentira contada por quem não tem coragem e determinação suficiente para colocar idéias em ação, um subterfúgio para quem prefere se acomodar, uma ladainha repetida por quem quer disfarçar a própria moleza.

Há pessoas que perdem anos de suas vidas com a incapacidade de vencer uma fraqueza, enganando a si mesmas com a idéia de que "nunca conseguirei mudar, as circunstâncias da vida me fizeram assim e sofrerei com isto para sempre". Quando enfim tentam fazer algo a respeito, fazem uma viagem superficial para dentro de si mesmos e, quando pensam ter descoberto a origem do problema, agarram-se a isso como justificativa para não mais seguir em frente. A cada estágio, uma nova evasiva. A cada avanço, uma nova desculpa para estagnar. 

Os fisiculturistas costumam dizer que "quem quer, encontra um jeito. Quem não quer, encontra uma desculpa". 

A verdade é que os problemas existem para serem resolvidos, e não para justificar ações ou inações. É mais fácil adotar uma postura de "incompreendido pela sociedade" e "produto do meio", do que efetivamente tentar modificar este panorama. 

Aqueles que, apesar de acomodados, são um pouco mais espertos, costumam agregar à estratégia da tergiversação uma outra: criar um argumento forte para convencer toda a sociedade de que realmente não se pode lutar contra certas coisas. Assim, todos ficam iludidos, e a negligência do indivíduo fica legitimada.

Convenhamos que lutar e fazer a diferença não é tão simples... É difícil, é imensamente difícil. De fato, é mais fácil ficar parado e arranjar um pretexto. Entretanto, há de se concordar também que é importante ser honesto consigo mesmo e com o mundo. Lutar ou esmorecer: cabe a cada um fazer a sua opção. Mas aquele que opta deve ter a coragem de assumir a sua escolha, para si e para os outros.


(Pergunta 872 do Livro dos Espíritos)

O que há por trás da admiração por Pereirão

A atriz Lília Cabral tem chamado a atenção dos brasileiros em razão de sua performance como a personagem Griselda, conhecida por "Pereirão", protagonista da novela "Fina Estampa", da Rede Globo. Destoando das convencionais mocinhas de novelas, "Pereirão" é uma mãe de família pobre que trabalha arduamente para sustentar o lar e se recusa a aceitar a fazer o papel de mulher frágil e subserviente. Ela se autoentitula um "marido de aluguel"; não faz corpo mole para serviço nenhum. É guerreira e batalhadora, e mesmo com todas as dificuldades da vida, faz questão de ensinar a seus filhos o valor do trabalho e da honestidade. 

A popularidade de "Pereirão" é tão grande que ela chegou a ilustrar a capa da revista Veja, em novembro de 2011, que definiu-a como uma heroína dos tempos modernos e "um exemplo de ética e valores familiares". Ela é um retrato da classe média do nosso país; a essência da personagem é, outrossim, uma síntese da história da mulher brasileira, que precisou sair de casa para trabalhar e trazer dinheiro para o lar, mas continua exercendo as tarefas domésticas e zelando pela educação e formação do caráter dos filhos; e, além de tudo, Griselda representa ainda a mulher que aprendeu a não precisar da figura do homem para nada. 

Este último aspecto merece exame mais acurado. A relação de Griselda com a figura masculina, e em especial, a sua própria identificação com a figura masculina, é algo que deve ser analisado, sobretudo porque grande parte do sucesso da personagem se deve, justamente, ao fato de ela ser aquilo que zombeteiramente se chama de "mulher macho" - por esta razão o apelido "Pereirão", explicitamente representativo de uma identidade masculinizada, caiu na boca do povo.

"Pereirão" é admirada pelos telespectadores justamente por ser aquela mulher forte que não precisa de ninguém, quanto menos de um homem. E não precisa de um homem exatamente porque ela mesma desempenha tudo aquilo que se associa à figura masculina: Pereirão sabe consertar encanamentos, eletrificações, trocar pneus, e resolver quaisquer outros probleminhas do cotidiano doméstico que exijam força física e conhecimentos de mecânica. 

O caso cuja reflexão eu proponho é o seguinte: se ocorresse o contrário, será que conquistaria tanta fama? Se fosse um personagem masculino, mas com habilidades femininas, será que o Brasil cairia de amores por ele como caiu por Pereirão?

A questão é justamente essa: Griselda é respeitada, entre outros fatores, por seu lado masculinizada. Admira-se que uma mulher tenha uma faceta masculina, não porque o masculino é o oposto do feminino, mas sim, porque o sexo masculino é considerado melhor que o sexo feminino. Um homem com faceta feminina não seria tão admirado, porque o sexo feminino é considerado inferior ao sexo masculino. Pelo contrário: o que acontece com homens dotados de aspectos efeminados é que eles são ridicularizados. Afinal, por que alguém do "melhor sexo" iria querer exercer aptidões do "sexo inferior"? A sociedade conclui que um indivíduo assim só deve mesmo ser achincalhado. 

Durante a passagem dos séculos, a mulher, para conquistar seu espaço dentro da sociedade, viu-se necessitada de chegar o mais próximo possível de ser um homem: trabalhando fora de casa, desempenhando papéis que um homem desempenha, vestindo-se como homem (é relativamente recente a popularização das calças compridas, dos "terninhos" e dos cortes de cabelo "joãozinho", entre outros itens de moda manifestamente copiados da moda masculina), por vezes até agindo, falando e se comportando como um homem.

O que há por trás da valorização da mulher masculinizada é a própria depreciação da figura da mulher feminina. "Pereirão" jamais seria tão querida pelo público caso não subsistisse ainda na sociedade a idéia de que a mulher precisa assimilar-se ao homem para merecer respeito.

O conforto fútil

Pintura de Michel Borges, inspirada
no poema ao lado.
(Créditos: michelborges.com.br/2011/
08/05/blank-11-2/0)
"Casas entre bananeiras,
mulheres entre laranjeiras,
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus."
(Carlos Drummond de Andrade, 1930)


Tantos de nós buscamos e almejamos uma vida de conforto e tranquilidade, como se toda a vida constituísse uma longa e árdua caminhada em direção a esse destino no qual finalmente poderemos parar e descansar, e gozar infinitamente desse tão esperado sossego. 

No atual estágio de nossa sociedade dominada pelo capitalismo e consumismo, costumamos conceituar como fúteis aquelas pessoas que valorizam excessivamente os bens materiais. Generalmente, quando pensamos em alguém fútil, logo mentalizamos uma pessoa do sexo feminino, totalmente embelezada, bela e arrumada, fazendo compras e falando sobre as melhores grifes e sapatos, roupas e maquiagens. Esse é o conceito moderno de futilidade.

Imbuídos destes conceitos preconcebidos, mal paramos para pensar que a futilidade pode estar até mesmo onde é convencional dizer-se que há sabedoria. Afinal, fútil, segundo os dicionários, é tudo aquilo que é desprovido de importância, de valor. Leviano e superficial são alguns dos sinônimos. E o que é a superficialidade senão o ato de importar-se apenas com o que não está na essência das coisas? 

Fútil, portanto, é quem não faz questão de aprofundar-se em nada, quem não se interessa em ir afundo, quem "fica na superfície", quem só preza a aparência, o que está de fora, e nunca o que está dentro, nunca a essência, o valor, o significado. 

Partindo deste conceito, então, qual a diferença de uma patricinha fazendo compras no shopping e um homem que dedica todas as suas horas à limpeza e cuidado do seu carro? Quão vazia é a vida de ambos?

Qual a diferença de um ancião que passa os dias apenas sentada na cadeira de balanço da varanda de sua casa, e um jovem cuja vida gira em torno de apenas festas e bebidas? Todos eles estão plenamente ocupados com coisas que não levam a nada, que não têm significado algum. E por mais que a anciã seja considerada sábia, por sua idade e experiência de vida, e o homem seja considerado cuidadoso, por seu zelo e higiene com o próprio carro, o que eles estão acrescentando de útil às suas próprias vidas e às vidas das demais pessoas?

O conforto, a paz, a alegria, o bem estar, o prazer; todas estas sensações tão gostosas, se constituírem toda a razão de viver de alguém, são fúteis. 
Estar feliz, comer bem, dormir bem, ter bom sexo... Tudo isto, quando toma a maior parte de nossos dias ou mesmo nossos dias inteiros, é fútil. 
Preocupar-se em excesso com a nossa boa aparência, ou mesmo com a boa aparência de nossa casa ou nossos objetos, ocupando todo o nosso tempo com isso e deixando de despender tempo com coisas que agreguem algum conhecimento ou valor às nesses mentes e vidas, é fútil. 
Hobbies, atividades prazerosas, eventos divertidos; todas estas coisas, se constituírem um fim em si mesmos, e não um meio para que nos sintamos bem de modo a poder desempenhar melhor as demais atividade úteis de nossa vida, são fúteis.

O oposto da futilidade é a utilidade. Tudo que não é útil, é fútil. Nem sempre é tão fácil fazer esta distinção. Não são as coisas ou pessoas que são fúteis: é a combinação dos dois, é a opção de determinada pessoa fazer determinada coisa. Tudo que não é necessariamente útil transforma-se em útil na medida em que serve para aliviar uma tensão ou proporcionar uma pausa necessária à recarga das energias... Mas quando ultrapassa esse limite, volta a ser inútil, e portanto, fútil. A linha é tênue, contudo, é importante. Não só para que abandonemos a postura de apontar o dedo e julgar qual ser humano é fútil e qual não é (esta própria atitude já faz de nos um pouco fúteis também), mas também, para que olhemos mais atentamente para nós mesmos e saibamos escolher o que é melhor para nós. 

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

2011 (o meu e o de todos): retrospectiva e balancete

Chegadas as últimas semanas do ano, é comum vermos nas revistas, programas de TV e Internet algumas retrospectivas. É interessante relembrar os fatos que marcaram o ano que termina, para vermos como ele ficará registrado em nossas mentes. Na minha, particularmente, 2011 ficará marcado como um ano de conquistas e superações...

Em um contexto geral, este ano foi importante para o Brasil. Não diria que foi ótimo nem péssimo, mas que foi decisivo. Dilma Rousseff já chegou se impondo, mostrando seu estilo de governar e já antecipando que a marca que deseja deixar é a de diligência, trabalho árduo e seriedade. Literalmente, ela não brinca em serviço, ao contrário de seu antecessor (e isto não é uma crítica a ele). 

Ainda é cedo para que Dilma colha os louros de suas atitudes, mas, em compensação, o país e o resto do planeta já reagem a ela: a presidenta fecha o ano como a terceira mulher mais poderosa do mundo, segundo a revista americana Forbes, e como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, segundo a revista americana Time; seu governo termina o ano com 56% de aprovação (índice historicamente considerável, se comparado com os percentuais relativos ao primeiro ano de governo de Fernando Henrique Cardoso e de Lula), segundo a pesquisa do instituto brasileiro CNI/Ibope; e o Brasil encerra 2011 como a sexta maior potência econômica do mundo, segundo o jornal inglês The Guardian. Nada mal para alguém que é praticamente iniciante na política! 

Outro ponto a se destacar é o fato exaustivamente lembrado de que Dilma Rousseff é a primeira mulher a ser eleita chefe de Estado em nossa história. Repetir este clichê é uma via de mão dupla: afinal, ressaltar em demasia a peculiaridade da vitória de alguém do sexo feminino é também uma grande demonstração de machismo; se o fato de uma mulher ter alcançado um alto cargo é algo que gera espanto, então, está-se partindo do princípio de que mulheres não são capazes disto. 

Contudo, peço permissão para demonstrar o meu contentamento, a outra via da mão dupla: será que temos noção de quanto a eleição de Dilma significa para a história que será estudada por nossos filhos e netos? Dilma é a primeira de prováveis muitas outras que virão; e quando nossos descendentes estiverem observando as galerias de Presidentes nas páginas de seus livros didáticos, verão fotografias de mulheres indistintamente colocadas entre fotografias de homens, e tudo parecerá muito normal. Ninguém ficará surpreso ou admirado: 'presidentes podem ser homens e mulheres, por que não?'... Que belo pensamento para ser incutido nas mentes das crianças do futuro! Na verdade, este deveria ser o pensamento natural a todos nós. Preconceito e sexismo são coisas que não deveriam existir nunca. Quantos anos levamos para chegar a este patamar! Porém, antes tarde do que nunca. Será que a própria Dilma tem noção do peso de representar algo pelo qual milhares de mulheres lutaram e sonharam tanto? Observando sua sede de operosidade, é de se concluir que sim.

Em 2011, o mundo assistiu a história de vários países do Oriente Médio sofrer grandes reviravoltas; encantou-se com o casamento do Príncipe Wiliam com Kate Middleton; viu Adele trazer a soul music de volta às paradas musicais e Katy Perry e Rihanna consagrarem o sucesso do pop mainstream; comoveu-se com o tsunami que assolou o Japão, e mais ainda com a força dos japoneses que não se deixaram abalar; chocou-se com a morte de Osama Bin Laden (embora muitos acreditem que ele está vivo); chorou a morte de Liz Taylor, Amy Winehouse e Steve Jobs... 

O Brasil, por sua vez, escandalizou-se com novos escândalos de corrupção e a saída de vários Ministros; horrorizou-se com crimes bárbaros como o massacre em Realengo; comoveu-se com os cariocas que ficaram desabrigados após os deslizamentos de terra; viu a Favela da Rocinha ser tomada pela Polícia, no Rio de Janeiro; conquistou direitos relativos aos casais homoafetivos, cujas uniões foram reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal; torceu pela saúde de Reynaldo Gianecchini e do ex presidente Lula, que descobriram sofrer de câncer; testemunhou o nascimento de um novo partido político, o PSD; vibrou com o Rock in Rio; viu a consagração de Anderson Silva como novo ídolo do esporte das novas gerações, graças à expansão do MMA; e foi finalmente valorizado nos países do hemisfério norte...

Ah, este último fato merece muito destaque, pois diz respeito ao Brasil e ao mundo, ao mesmo tempo! A mesma Europa que sempre teve má vontade em recepcionar brasileiros e até mesmo nutria grande preconceito, agora, desolada com a crise econômica, vê seus cidadãos fazendo mil planos de tentar a vida no Brasil, que está em melhor situação do que nunca. Nosso crescimento econômico, aliado ao fracasso das políticas e da economia da maioria dos países europeus, criou uma situação tão vantajosa para nós, que até mesmo a cultura européia (um dos aspectos mais dissociantes deles para conosco) tem sido receptiva à nossa: o hit brasileiro "Ai se eu te pego", de Michel Teló, atingiu #1 nas paradas musicais da Suíça, Espanha e Itália, entre outros países. Até mesmo o jogador de futebol português Cristiano Ronaldo e jogadores de basquete da NBA foram filmados fazendo a coreografia da canção em suas partidas esportivas.

Brasil, quem te viu e quem te vê! Até que, para um país que começou sem planejamento e até sem mesmo a intenção de ser um país, estamos indo bem, não? 


“Este é o caminho da prosperidade, que está sendo construído por nós e para nós, sustentado numa forte democracia. O mundo hoje nos vê com respeito e confiança. E, 2012 será mais um marco de consolidação do modelo brasileiro.”
(Dilma Rousseff)


E, pelo visto, não foi só para o Brasil que 2011 representou conquista e vitória. Para mim, ocorreu da mesma forma. Tal qual para o Brasil, 2011 não foi para mim um ano muito fácil, mas sem dúvida, foi importante, e auxiliou-me a adquirir algum respeito por mim mesma e perante os outros, e a sentir-me melhor comigo mesma. Em 2011, consegui provar muitas coisas, mais a mim do que aos demais. Convenci-me, através de fatos (os argumentos eu já tinha há tempos, mas faltava a ação), que sou capaz de várias coisas... E, como consequência, posso até dizer que influenciei positivamente um reduzido porém significativo número de pessoas à minha volta.

É como ouvi em uma palestra, há algumas semanas, no Centro Espírita que frequento: quando decidimos realizar a reforma íntima, isto faz bem para nós e também para os que convivem conosco, que se inspiram com nossa atitude. Disto se pode concluir: aquele que se compromete a ser melhor assume para si uma grande responsabilidade... Uma vez tendo mostrado aos demais que é possível alcançar um objetivo, devemos persistir e sermos firmes; afinal, há gente que depende da nossa própria força para adquirir a sua própria, há gente que nos tem como exemplo, que recorre à nossa imagem quando busca ânimo para seguir em frente. Se desmoronamos, essa gente pode desmoronar também... Eis uma reflexão interessante para levarmos para o ano novo. 

2012, para mim, será um ano de construção de bases para o futuro. Boa parte do que será minha vida dentro de alguns anos depende do resultado das ações que praticarei em 2012... É claro que o caminho de nossas vidas pode sempre ser mudado; contudo, também é importante enxergar cada momento como uma oportunidade para assegurar um futuro melhor. 

2011, bom ou ruim, está indo embora... Que venha 2012, e que a frescura de um novo ano contagie nossos espíritos com o convite da mudança - para melhor, sempre!


“Temos todos os motivos para olhar 2012 com grande otimismo, com a certeza de que o Brasil continuará crescendo com estabilidade e diminuindo a desigualdade em um ambiente de pujante democracia”
(Dilma Rousseff)

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Samples: plágio ou homenagem?

Pesquisando para escrever sobre as influências que a música soul, disco e funk exerceram na obra de Beyoncé, surpreendi-me ao descobrir quantas samples há em suas canções. Aos que não sabem, samples, ou samplings, são pedaços de canções inseridos em outras. É o que se vê, por exemplo, em "I'll be missing you", sucesso do rapper P. Diddy (à época, 1997, ele ainda era chamado de Puff Daddy), cujo refrão contém uma sample com os versos inicias de "Every breath you take", balada lançada em 1983 pela banda The Police.

Em pesquisas mais aprofundadas, admirei-me ainda mais ao constatar como é comum, na indústria da música pop, o uso de samples e a produção de canções explicitamente inspiradas em outras. Acabei encontrando o site Who Sampled, o qual se propõe a "explorar e discutir o DNA da música" e elenca de forma minuciosa qual canção foi inspirada/sampleada de qual.

Chega a ser assustadora a forma como tantos hits da cultura pop dos últimos anos carecem de originalidade! Não que eu condene a idéia de reciclar a genialidade de pioneiros dos gêneros musicais... Simplesmente fiquei surpresa ao saber que estava errada ao pensar que tratavam-se de criações concebidas na minha época.

Vários hits modernos cuja essência da primazia consiste justamente no instrumental, que por algum motivo ou outro se destaca, na verdade não passam de cópias ou releituras de outras canções preexistentes. Cite-se, por exemplo, "I gotta feeling", dos Black Eyed Peas, que fechou o ano de 2009 como uma das canções mais executadas nas rádios e nas pistas de dança. Deveras, sua inconfundível parte instrumental não pode ser considerada uma criação do grupo, porque se trata da base da canção "Take a dive", de Bryan Pringle, lançada dez anos antes.




É também o caso de "Crazy in love", mega hit de 2003 da já comentada Beyoncé, cujo instrumental composto pelas metaleiras e a batida escandecente é uma reprodução integral de uma parte da canção "Are you my woman", do grupo The Chi-Lites, lançada em 1971, ou seja, 32 anos antes de "Crazy in love"; e "Get right", single de Jennifer Lopez, lançado em 2005, cujo solo de saxofone que marca a canção foi extraído de "Soul power 74", canção de Maceo and The Macks, lançada em 1974, ou seja, mais de 3o anos antes.


Em canções de rap, é mais compreensível o uso de samples. Afinal, rappers geralmente não são trabalham com melodias, apenas com letras. Sendo assim, fazem uso de refrões ou bases de outras canções já conhecidas para colocarem seus raps por cima. Talvez por este motivo os rappers são recordistas em uso de samples. Vejamos, por exemplo, Eminem e Nicki Minaj:





Mais surpreendente ainda é ver que existem canções inteiramente sampleadas! Como exemplo temos dois singles do primeiro álbum solo de Fergie, vocalista dos Black Eyed Peas, lançado em 2006: "Fergalicious" e "Clumsy".  

O hit "Fergalicious" é uma junção de três sucessos da velha guarda oitentista do hip hop americano: 
* "Throw the dick" de 2 Live Crew, canção de 1986, da qual foi retirada a batida e os versos de rap ("Listen up y'all..."); 
* "Give it all you got", de Afro-Rican, de 1987, cujos segundos iniciais - o beat zonzo e a contagem "Four, tres, two, uno" - foram integralmente reproduzidos; 
* "Supersonic", funk eletrônico de J. J. Fad, lançado em 1987, e que rendeu a "Fergalicious" a melodia dos versos. 

Já a popzinha "Clumsy" é pouco mais que uma combinação de um rock de 1956, "The girl can't help it", do lendário Little Richard, com os teclados de "The bubble bunch", de 1982, do pioneiro do rap eletrônico Jimmy Spicer. Basta ouvir as canções originais para perceber... "Clumsy" é uma soma das duas. 

Dois outros exemplos de canções compostas absolutamente por elementos de outras canções são "Dilemma", dueto de Nelly e Kelly Rowland que dominou as paradas musicais em 2002: enquanto a batida e melodia são da balada "You and me" (1977), de George Duke, o refrão romanticamente cantado por Kelly é uma sample de "Love, need and want you" (1983), da diva da soul music Patti LaBelle; e "Come back to me", primeiro single da cantora e atriz Vanessa Hudgens, lançado em 2006: o estilo de cantar dos versos iniciais remete a "Complicated" (2002), também o primeiro sucesso da canadense Avril Lavigne, e em toda a canção encontramos ecos do grande hit de 1970, "Baby come back", do grupo Player.

Estes são apenas alguns exemplares... Existem centenas de sucessos da música pop que contêm elementos escancarados de outros sucessos do passado, sem contar os que foram somente inspirados em outros, com influências menos perceptíveis.

Seria a lei de Lavoisier ("nada se cria, nada se perde; tudo se transforma") aplicada à música pop? Em praticamente todos os exemplos citados acima, as referências são à era old school da música negra dos Estados Unidos, desde o soul revolucionário da Motown, representado por ícones como Michael Jackson, Stevie Wonder, Four Tops e Supremes, até os precursores do hip hop moderno, aqueles que, entre os anos 80 e 90, ousaram agregar componentes eletrônicos ao rap e ao funk. Será que, depois de todas essas explosões de criatividade dadas entre as décadas de 1960 e 1990, não se criou mais nada? Tudo é uma cópia, uma reprodução, uma releitura? Ou seria apenas inspiração, homenagem?

Em hits como "Dirty bit", dos Black Eyed Peas, e "On the floor", de Jennifer Lopez, de 2010 e 2011, a menção é muito explícita, já que ambos usam samples de super sucessos dos anos 80 ("The time of my life", de Bill Medley e Jennifer Warnes, e "Lambada", do grupo Kaomarespectivamente) sem o menor pudor. Pode-se inclusive dizer que as criações de ambos foram especialmente baseadas nas versões inspiradoras, razão pela qual, acredito eu, trata-se de canções homenageantes, e não plagiantes. 

Em outros casos, contudo, a intenção de imitar é manifesta, como em "Mary Jane's shoes", de Fergie, cuja melodia do refrão é totalmente igual ao imortal refrão de "No woman no cry", do jamaicano Bob Marley; ou como em "U can't touch this", canção que consagrou o rapper MC Hammer em 1990, e que possui a mesma batida, melodia, ritmo e estilo de "Super freak", canção de 1981, de Rick James.

Se procurarmos com afinco veremos que, em termos de música pop nos moldes atuais (aquela produzida com bases eletrônicas), quase tudo faz alguma alusão ou possui alguma referência a alguma obra antiga. Qual o limite até o qual se pode dizer que uma obra é ou não original? A questão é tão séria que, por exemplo, o grande hit de Lady GaGa neste ano, "Born this way", é acusado por todos de ser um plágio de "Express yourself", que Madonna lançou em 1989; mas esta canção, por sua vez, também é uma sample de "Respect yourself", de 1972, do grupo de soul The Staple Singers. Ou seja: uma imitou outra, que imitou outra... 

Um mesmo conceito viajando por décadas: nos anos 1970, as Staple Singers; nos anos 1980, Madonna; nos anos 2010, Lady GaGa

Porém, o fato é que nunca se sabe até que ponto inspirar-se em uma canção para fazer outra é uma atitude condenável. Grandes canções que marcam gerações podem muito bem não serem 100% originais e ainda assim serem incríveis. "Single ladies", de Beyoncé, por exemplo, foi um dos grandes hits do ano de 2009 e com certeza entrou para a história da música pop, devido ao enorme sucesso de seu refrão, videoclipe e coreografia; mas há quem diga que a batida da canção é uma versão remixada da batida de "Switch" (2005), de Will Smith; e mesmo assim, "Single ladies" não perde seu brilho e genialidade. "Don't stop the music", grande hit dance de Rihanna em 2007, contem elementos vocais de "Wanna be startin' something" (1982), de Michael Jackson, e isto não desmerece a canção, já que apenas a ilustra. E até o ousado e imortalizado sucesso de 1985 de Madonna, "Like a virgin", teve alguns segundinhos (os iniciais, mais especificamente) furtados de "I can't help myself", balada dos Four Tops, lançada 20 anos antes, e nem isso constitui empecilho para que "Like a virgin" ocupe lugar de destaque na história da música pop, afinal, a parte "copiada" apenas serviu para que a música se inicie de forma interessante, não havendo mais sinais de sample no restante dela.

Outrossim, há de se levar em consideração o fato de que os compositores e produtores das canções mencionadas são músicos que passaram toda a vida escutando grandes artistas que os inspiram e fascinam... É natural que a obra destes exerça influência sobre a obra daqueles. Um verso, uma nota, um solo de algum instrumento, uma batida impressionante, uma frase de impacto; qualquer elemento de alguma canção pode chamar a atenção de um ouvinte, e este ficará com isto em mente, até que ele o coloque em seu próprio trabalho. Até onde vão as regras que limitam a obra de quem trabalha com arte, criatividade, música, inspiração?

Os samples utilizados em sucessos atuais, portanto, são uma prova e uma amostra da relevância que a música das décadas passadas possui até hoje. É de se lamentar que muitas pessoas desinteressadas nas raízes da música ouçam alguns sucessos contemporâneos e dêem aos seus intérpretes os créditos, quando na verdade a origem daquilo que efetivamente faz da canção algo especial está na obra de alguém que morreu antes mesmo da pessoa nascer. 

Entretanto, às pessoas que gostam e se preocupam em pesquisar sobre música, os samples levam-nas a descobrir artistas desconhecidos, sonoridades diferentes, e a entender melhor sobre o princípio dos gêneros musicais. Se os sampleadores conseguirem atingir esse escopo de levar às novas gerações o brilhantismo da música dos antepassados, creio que seus trabalhos são dignos de muito mérito.

Beyoncé bebendo na fonte da black music em seu álbum "4"

Curiosamente, apesar de sempre ter admirado Beyoncé como artista, em especial por suas performances e incrível capacidade vocal, sempre julguei sua música como descartável. Sempre fui fascinada por suas habilidades na dança, seu carisma e odemagnetismo. Seu dueto com Prince no Grammy Awards de 2004 é, sem dúvida, o meu dueto favorito de todos os tempos e uma de suas melhores performances de todos os tempos, em minhLa opinião. Seu DVD "Live at Wembley" é uma verdadeira aula de presença de palco: adoro seus gestos, coreografia, suas atitudes performáticas, sua força, seu brilho. Também sempre gostei de ouvi-la cantando covers de grandes clássicos como "At last", "All I could was cry" e "The closer I get to you". Sua forma de cantar me agrada: sua voz é potente, ela alcança notas altíssimas, e eu gosto disso!

Mesmo assim, nada disso até então havia sido suficiente para que eu nutrisse algum respeito por sua música, de per si. Hits como "Crazy in love" e "Single ladies" certamente fizeram história e serão comentados pelas próximas gerações, mas se esquecermos o impacto que causaram, ficamos apenas com duas canções dançantes sem nada de muito interessante a não ser a batida envolvente. Pelo menos assim eu pensava até ouvir o álbum "4", lançado em junho de 2011.

Às vezes eu preciso ter contato com uma obra de uma forma diferente para enfim conseguir apreciá-la e entendê-la como ela realmente é - ou, quem sabe, da forma como me soa, de acordo com o meu próprio modo de ver a vida. 

"Run the world": Heather Morris cantando
em Glee, e o videoclipe de Beyoncé
Assim foi com "Run the world", primeiro single de "4", que à primeira escuta não me pareceu grande coisa. "Apenas mais uma música dançante da Beyoncé", eu pensei. Porém, quando a personagem Brittany, de Glee, cantou-a no terceiro episódio da terceira temporada da série, finalmente percebi o grande hino que ela é! Beyoncé nunca escondeu seu entusiasmo pelo feminismo (em canções de álbuns anteriores, sempre fez questão de frisar a independência feminina, como em "Independent woman", e falar de como é importante que a mulher se valorize, como em "If I were a boy" e "Irreplaceable"), mas em "Run the world" ela foi mais explícita do que nunca: mais que uma ode ao mérito feminino, a canção é uma verdadeira convocação ("Who are we? What we run? The world!") às mulheres para que se reconheçam como a grande mola propulsora do mundo ("My persuasion can build a nation...").

Beyoncé cantando
"Love on top" no
VMA 2011
O segundo single/videoclipe a ser lançado foi "Best thing I never had", que é uma canção bonita e agradável, mas, em um primeiro momento, não me pareceu nada além disso. "Só mais uma balada rhythm and blues da Beyoncé", pensei. Foi "Love on top" que aguçou meu interesse pelo álbum "4". Quando vi Beyoncé cantando esta canção no Video Music Awards de 2011, com direito a traje inspirado em Michael Jackson e a revelação de sua gravidez, interessei-me e fui escutá-la melhor. É soul music pura! Se fosse possível voltar no tempo e tocar "Love on top" em uma rádio na década de 1970, ninguém poderia dizer que se trata de algo produzido em 2011.

"Love on top" me levou a pesquisar sobre o resto do álbum, e eu sinceramente me surpreendi. Beyoncé sempre fez questão de se afirmar como uma artista influenciada pela clássica black music, mas em "4" esta influência se manifesta de forma mais clara que em qualquer outro álbum seu. É um álbum bastante intimista, sem muitas canções com potencial para hit, mas todas dotadas de grande carga emocional, intensas e onustas de referências a grandes ícones do soul, funk, hip hop e rhythm and blues.

Cenas do videoclipe de "1+1"
O álbum é aberto pela belíssima balada "1+1", que facilmente se enquadra na categoria de canções que definem Beyoncé como uma diva no mesmo nível de Celine Dion e Mariah Carey: o gênero 'balada romântica'. Em "1+1", Beyoncé mostra sua faceta apaixonada. "Se eu não tenho nada, tenho você", ela canta, "pois nós não temos nada além de amor". É incrível como a mesma Beyoncé que costuma impor-se como poderosa e independente, frequentemente também se amostra devotada ao homem amado de uma maneira quase submissa (como em "Dangerously in love", canção de seu primeiro álbum).
A segunda canção é "I care", outra balada forte e dramática, com ecos no refrão ("La la la la la...") que remetem-nos a "Beautiful liar", canção de Beyoncé em parceria com Shakira. Logo depois vem "I miss you", talvez a balada mais bela do álbum, composta por Beyoncé juntamente a Shea Taylor, cujo tom triste e levemente sombrio lembra "Disappear", outra linda canção do álbum anterior, "I am Sasha Fierce". 

Em seguida vem "Best thing I never had", a equivalente de "Irreplaceable" (do álbum "B'day") do álbum "4": um rhythm and blues envolvente e light cuja letra fala sobre as benesses do término de um relacionamento. A quinta faixa é "Party", uma canção festiva à moda antiga, com a participação de Kanye West e Andre 3000, do Outkast. Pelo título, poderíamos imaginar que "Party" seria a canção do álbum que mais se identificaria com os hits anteriores de Beyoncé... Mas não! "Party" é a primeira canção de "4" que mostra uma Beyoncé antenada na funk music dos anos 70 e a soul music do início dos anos 80.

The Chi-Lites, conjunto musical que sempre inspirou
Beyoncé; e na foto ao lado, ela cantando "Rather die
young" em seu DVD "Live at Roseland"
E falando em black music dos anos 70 e 80, a sexta faixa é "Rather die young", mais uma canção em que Beyoncé declara-se desesperadamente (no refrão, ela canta: "Eu prefiro morrer jovem do que viver sem você, prefiro nem mesmo viver do que viver sem você"); mais uma canção cuja sonoridade lembra a música negra destas décadas, de grupos como The O'Jays ou The Jackson Five. Em seu DVD "Live at Roseland - The elements of 4", Beyoncé diz que "Rather die young" foi inspirada nos Chi-Lites, grupo de soul cujo auge do sucesso deu-se no final da década de 1960 e início da década de 1970. Não é a primeira vez que os Chi-Lites servem de inspiração para Beyoncé: o grande sucesso da estréia solo de Beyoncé em 2003, "Crazy in love", contém uma sample de "Are you my woman?". Falarei mais adiante a respeito destas e influências da black music na música feita por Beyoncé.

A próxima faixa é "Start over", balada na qual Beyoncé sai-se muito bem nos vocais. O estilo mostra que Beyoncé, juntamente a Shea Taylor (o mesmo de "I miss you") e Ester Dean, que também é cantora, ainda estavam com um pé no álbum "I am Sasha Fierce" quando compuseram "Start over". Curiosamente, foi a única canção de "4" a não ser cantada no DVD "Live at Roseland"... Uma pena, pois a força dos vocais de Beyoncé e todo o drama de "Start over" fariam da performance ao vivo uma apresentação incrível. 

A oitava faixa é a já comentada "Love on top", da qual se pode dizer o mesmo que se disse de "Rather die young". É perfeitamente possível imaginar Chaka Khan, Teena Marie ou as Mary Jane Girls  cantando algo como "Love on top" nos anos 1970 ou 1980, tamanha a identidade da canção! Outro destaque é a forma como, nos segundos finais, Beyoncé vai aumentando o tom a cada vez que repete o refrão, atingindo notas altíssimas e dando um show de alcance vocal.

Posteriormente temos "Countdown", uma deliciosa canção que mescla perfeitamente o rhythm and blues dos tempos áureos e o hip hop moderno, contendo um sample de "Uhh Ahh", de Boyz II Men, no refrão. E falando em hip hop moderno, a décima faixa, "End of time", malgrado mescle vários elementos de world music, havendo Beyoncé até mesmo confirmado que foi inspirada na música do nigeriano Fela Kuti, é a que mais se aproxima dos hits dançantes do passado de Beyoncé - tanto que ensejou uma das melhores coreografias, como se vê em suas performances ao vivo.

A penúltima canção do álbum é "I was here", emocionante balada escrita por Diane Warren, na qual Beyoncé canta sobre a satisfação em ter deixado sua marca no mundo ("Quando eu deixar este mundo, não deixarei arrependimentos; deixarei algo para ser lembrado, para que não se esqueçam de que eu estive aqui; eu vivi, eu amei, eu estive aqui"). É a canção que fecha seu show do DVD "Live at Roseland", e nesta apresentação, é mostrada uma bonita montagem de momentos importantes da carreira de Beyoncé.

Por fim, "4" é encerrado com a frenética "Run the world", cujo toque estridente e contagiante é uma sample de "Pon de floor", de Major Lazer. 

Somente depois, ao pesquisar sobre o álbum, descobri que usar samples de canções de outros artistas, especialmente de grandes expoentes e pioneiros da música negra, é um velho costume de Beyoncé. Em "4", por exemplo, além de "Run the world" e "Countdown", que como já mencionei, contêm samples, "Party" também tem elementos da baladinha "Right and a wrong way", de Keith Sweat, de "Footsteps in the dark", dos Isley Brothers, e do sucesso  de Doug E. Fresh, "La di da di".

Diga-se de passagem que o rapper Doug E. Fresh, considerado um dos pioneiros do beatbox, inspirou ainda a base da versão original de "Best thing I never had", que pode ser conferida neste vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=O-ap9zvR8qM&feature=related. Esta versão, que acabou sendo modificada até tornar-se aquela que escutamos no álbum, contém sample da bateria da canção "The Show", também de Doug.

Pesquisando mais afundo, descobrimos que desde a época das Destiny's Child, Beyoncé e seus produtores usavam samples de canções de seus artistas favoritos; por exemplo:

* Em Bootylicious, sucesso das Destiny's Child, a abertura da canção é feita com um riff de guitarra de Stevie Nicks, retirado da canção "The edge of seventeen";
* "Baby boy", segundo single do primeiro álbum solo de Beyoncé, foi inspirado em "Hot Stepper", canção do jamaicano Ini Kamoze;
* "Naughty girl", também do álbum "Dangerously in love", contém referência explícita ao sucesso de Donna Summer, "Love to love you baby";
* A baladinha "Be with you", do mesmo álbum, foi baseada em "Ain't nothing I can do", cantor de rhythm and blues dos anos 70;
* O instrumental triunfal que abre "Upgrade u", sucesso do segundo álbum de Beyoncé, foi extraído da canção "Girls can't do what the guys do", de Betty Wright.


Logo se percebe que Beyoncé apraz a black music em suas várias vertentes e nuances, desde o soul, jazz, blues, disco music e o rhythm and blues, até o funk, rap e hip hop, passando ainda pelas variações com elementos de outras culturas, como o dancehall e o ragga. Em suas músicas, encontramos referências e influências da música negra dos anos 60 até os anos 90. Ela própria cita Michael Jackson, Luther Vandross, Diana Ross, Donna Summer, Aretha Franklin, Mary J. Blidge, Tina Turner e as TLC como suas grandes influências (fonte: http://thebeyoncefablogbrasil.blogspot.com/2010/08/artistas-que-influenciam-beyonce.html). Beyoncé valoriza suas raízes, e isto se reflete na música que compõe, canta e produz.


Audrey Hepburn, em "Funny Face", e Beyoncé,
em "Countdown". Crédito da foto: site Roc 4 Life 
E não é só na sonoridade que a cantora gosta de agregar componentes da obra de seus ídolos. Nos videoclipes e performances, Beyoncé também homenageia, ou às vezes até mesmo imita, grandes dançarinos e coreógrafos. Assim ela fez em seu recente videoclipe "Countdown", do álbum "4", no qual há uma cena em que se veste igual à personagem de Audrey Hepburn no filme "Funny Face". Neste mesmo clipe, Beyoncé reproduz uma coreografia da belga Anne Teresa De Keersmaker. "Countdown" ainda faz alusões a Twiggy e Diana Ross. 


A coreografia de "Single ladies", talvez a mais famosa da carreira de Beyoncé, também contém passos retirados da obra de Bob Fosse, "Mexican breakfast", de 1969, como se observa na montagem abaixo (créditos do blog Mitinguis):






Não é raro ver notícias na mídia de artistas acusando Beyoncé de plágio. No que concerne ao álbum "4", além do clipe de "Countdown", os clipes de "Love on top" e "Party" também foram alvos de críticas, devido às excessivas semelhanças com os vídeos de "If it isn't love", da banda New Edition, e "My neck my back", da cantora Khia, respectivamente. 


Não se sabe qual a intenção de Beyoncé ao fazer estas referências escancaradas, quase cópias mesmo, a tantas obras. Provavelmente, ao ouvi-las ou assisti-las, ela encontra a inspiração para algo novo; mas, ao que parece, ela não se importa em ser considerada uma imitadora, pois continua inserindo elementos de canções/coreografias preexistentes em seus próprios trabalhos. 


Algo não se pode negar: aquele que se propõe a pesquisar sobre as obras originais que acabam gerando as obras de Beyoncé, acaba descobrindo muito mais acerca dos gêneros e artistas que tanto a inspiram. Foi assim comigo. Se a black music sempre me fascinou, fiquei ainda mais admirada ao ver a extensão do gosto musical de Beyoncé, e a profundidade de seus conhecimentos a respeito. 


Plagiadora ou não, Beyoncé tem o mérito de levar a música negra às pessoas que consumem sua música. Mesmo que de forma indireta ou inconsciente, quem ouve "Crazy in love" está ouvindo The Chi-Lites, quem ouve suas baladas rhythm and blues está conhecendo um pouco de Diana Ross e Toni Braxton, e quem dança ao som de "Run the world" está celebrando o legado de Fela Kuti. 




Beyoncé é, sem dúvidas, um dos maiores ícones da cultura negra de todos os tempos. Não à toa foi eleita pela Billboard como a artista feminina da década de 2000-2009, e a revista Forbes colocou-a em primeiro lugar ao eleger as mulheres afro-americanas mais poderosas dos Estados Unidos.


O sucesso e ascensão de Beyoncé - que já vinha sendo preparado desde a época em que ela era a líder da girl band Destiny's Child, mas que consolidou-se quando ela lançou seu primeiro álbum solo, restando "Crazy in love" como a canção mais executada do ano de 2003, segundo o site Rock on the net - serviu para as negras dos Estados Unidos (e, por que não?, do mundo inteiro) como uma amostra de que as mulheres negras podem ser o que quiserem: poderosas, independentes, admiradas pelo corpo mas também pelo talento. Qual outra mulher no mundo consegue a proeza de estar, ao mesmo tempo, no topo da lista dos artistas recordistas do Grammy Awards, e no topo da lista das mulheres mais desejadas do planeta? Em um país como os Estados Unidos, onde ainda se encontra vestígios de racismo, o fato de uma negra ser a resposta para estas perguntas é bastante significativo.


Além de um marco na história do povo negro, e na história das mulheres, Beyoncé é também um marco na história da música negra, e ademais, da música como um todo. Acredito que isto é suficiente para lhe conferir a prerrogativa de reproduzir e contemporizar obras de artistas que abriram caminho para que ela se tornasse o que é hoje. 

sábado, 24 de dezembro de 2011

Natal de reflexão

"You only see what your eyes want to see
How can life be what you want it to be
You're frozen
When your heart's not open

You're so consumed with how much you get
You waste your time with hate and regret
You're broken
When your heart's not open"


Ouvindo "Frozen", sucesso de Madonna no ano de 1998, encontrei nela a mensagem que meneava no ar há alguns dias, à qual até então eu ainda não havia me atentado: a vida é o que nós queremos que ela seja... A vida é o que fazemos dela. 

Quando abrimos nosso coração e apuramos nossos sentidos para perceber os sinais que o universo nos manda, nós conseguimos senti-los. E pode até parecer falácia ou repetição de clichês, mas a verdade é o que Madonna canta: "você está congelado, quando seu coração não está aberto". 

O gelo é pétreo, é estático, é duro. É incolor, porque petrificou-se em seu próprio nada. É quadrado porque se amoldou a um recipiente quadrado. É inflexível e pálido porque se acomodou às circunstâncias. É o que acontece quando nossa mente e coração não se abrem: ficamos estagnados e incapazes de enxergar as oportunidades, incapazes de encontrar no mundo à nossa volta os estímulos e os recursos necessários para operar as mudanças que queremos na vida.

A nossa existência vale a pena na mesma medida em que queremos que ela valha a pena; ela é tão boa quanto fazemos sê-la.

O Natal possui o significado que atribuímos a ele: presentes e consumismo; ou família e reunião; ou reflexão e balanço; ou louvor e preces; ou festividades e extravagâncias. 

Então, já que podemos transformar cada data daquilo que bem desejamos, por que não fazermos do Natal a época de pensar nas coisas boas da vida? Já que estão todos embebidos neste clima de festa e celebração, por que não aproveitarmos o lado menos fútil da situação?: sermos gratos por tudo que é bom em nossa vida, e pedirmos força e maturidade para entender e superar aquilo que não for tão bom assim... Por que não? 

Que Deus abençoe a nós todos e dê-nos sabedoria para comemorar mais um Natal de mente e coração abertos! Feliz Natal!





O Brilho do Natal

Brilha, de novo, o Natal de Jesus no mundo!
A manjedoura, a estrela, os pastores felizes.
Chega o Mestre trazendo novas diretrizes,
Enaltecendo o bem, o trabalho e o amor,
Ensina, cura e canta o subido valor
Do sal que à Terra empresta sabor profundo.
Brilha um novo Natal com seus novos matizes,
E a busca de Jesus pelo agasalho humano
Incansável prossegue, ainda que seja um pano
Como a mais sincera oferta dos corações.
Busca alcançar as almas, famílias, nações,
Onde a ventura possa, então, deitar raízes.
Brilha agora o Natal com pujante vigor,
Esparzindo esperanças na vida da gente,
Quando claudica a fé e a dor é renitente.
Convoca-nos, Jesus, à coragem sem jaça,
A mostrar que na Terra toda angústia passa
Para quem forja a fé nos empenhos do amor.
É que, esplêndido, o Natal brilha ano após ano,
Como sempre inspirando-nos benevolência,
Ao mesmo tempo a lhaneza e a doce paciência,
Para que junto ao lar ou no trabalho diário,
Noss'alma seja qual precioso relicário
Das blandícias do Céu em prol do ser humano.
Brilha o Natal, cada vez mais aconchegante,
A nos propor novos caminhos de prudência
Ante as mais graves decisões e, sem violência,
Tudo possamos resolver na luz do bem,
Seguindo assim, sem guardar mágoa de ninguém,
Bem junto à vibração de Jesus abençoante.
Brilha o Natal no imo da mais tosca choupana,
Como brilha no paço mais rico do mundo,
Para ensinar-nos, em verdade, que, no fundo,
Tem pouca importância a riqueza exterior,
Quando seguimos vinculados ao Senhor,
Cuja aura sublime todo o planeta irmana.
Ave, Senhor, ante o Teu berço recordado!
Ante Tua saga proclamada como um marco,
Diante do poderio humano, ingênuo e parco,
Que não resiste do tempo à força e à voragem.
Que o Teu augusto coração dê-nos coragem
De viver Teu Natal de íntimo renovado.
Brilha, de novo, o Natal de Jesus no mundo!
A manjedoura, a estrela e novas esperanças
De que aqui se implemente as sonhadas mudanças.
A Terra roga a Deus equilíbrio, eqüidade,
P'ra viver sob a luz do amor e da verdade,
Cada dia, com Cristo, o Natal mais fecundo.
Raul Teixeira. Ditado pelo Espírito Ivan de Albuquerque. Mensagem psicografada pelo médium Raul Teixeira, em 22.9.2004, na Sociedade Espírita Fraternidade, Niterói-RJ. (fonte: www.feparana.com.br).